domingo, 28 de fevereiro de 2010

Jardim da alma

Não ouso permitir que a pequena idéia
A pretensa frase
A estranha palavra
Fugidias, escapem de mim.
Ponho-as no papel, todas.
Para revelarem a mim mesma
Minha alma
E me permitirem construir
Pouco a pouco
Meu jardim.

Incertezas

A imagem do mar
Um navio a chegar...
Para quem acena?
Estarão o céu e o sol
O mar, a areia e o sal
A redimir ou condenar?
Onde estão os mistérios?
Será a incerteza
Seu ministério?

Estações

Ao final da tarde, nuvens pesadas de chuva cresceram do calor que fizera durante o dia. Novamente. Os verões são assim: intensos, temperamentais, quase malcriados. E, talvez, assim deva ser. Não há verões sem o tormento das fortes chuvas, assim como não há invernos sem gostosos dias de sol. Lembro-me dos outonos de minha infância: dias claros, azuis intensos, os mais bonitos do ano. E, apesar das folhas secas que caíam na grama, insistindo em mantê-la sempre coberta, não havia como resistir ao encanto das flores-de-maio que florescem exatamente nesta época. Deixam cair seus longos cabelos de flores brancas, cor-de-rosa, alaranjadas numa teimosia que desafia a estação.
Sempre gostei das primaveras. Elas trazem um alento após dias frios e o desejo de, novamente, gozar a vida do lado de fora: enchem-se os parques, as piscinas, voltam as brincadeiras pelas ruas e nos gramados das casas. E assim, mais uma vez, deve ser. A sucessão dos eventos, das temperaturas, dos encantamentos e das singularidades. A sempre presente dúvida de como será aquela nova estação, se mais seca, mais chuvosa, mais quente, mais gelada. Numa sucessão interminável de surpresas, também nossa vida se nos mostra como algo sempre em mutação, pronta para nos surpreender com o que nos comove, nos assusta, nos alegra, o que nos tranquiliza ou o que nos faz pensar simplesmente que sempre será assim e que o controle das coisas não está em nossas mãos, embora desejássemos que sim. Nada que nos acontece modifica nossa vida de forma definitiva. Mais à frente, haverá sempre uma nova estação e, com ela, todas as suas peculiaridades. Resta-nos viver. Resta-nos enfrentar.

sábado, 27 de fevereiro de 2010

Pérolas

Título de um livro de Rubem Alves: "Ostra feliz não faz pérola". Resta-me supor que estes grãos de areia a me perturbar, incomodar, coçar, injuriar, que, nas ostras, se tornam preciosidades que compõem belos ornamentos, estejam se transformando em algo precioso em mim também, feito de letras, palavras, frases, textos. Ornamentos que tentam dar sentido às coisas na medida em que caem no papel.

quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

Trigêmeos

Minha irmã teve três bebês. Trigêmeos. Três de uma só vez, juntos. Milagre da vida e da ciência. Tudo em triplo: sustos, alegrias, descobertas, choros, fraldas, resfriados, banhos, tombos, cansaço... E o encantamento... Três pequenas criaturas diferentes que nos seduzem em dose tripla.
Não os tenho por perto. Moro longe. Sinto falta de vê-los crescer e descobrir o mundo como fizeram meus filhos antes deles.
Descobri que são um pouco meus também, que adoro saber deles e seus pequenos passinhos (ainda que estejam engatinhando por hora). Que minha irmã tem dentro de si uma força e uma disposição que nem mesmo ela sabe que tem. E minha mãe, um grande coração e uma generosidade sem par, num trabalho cotidiano que não parece querer acabar.
É algo único a acontecer com uma pessoa. E com todos em volta. Não há filho que seja igual. Não há experiência que seja a mesma ou que não possa ser partilhada. A experiência da maternidade (e da paternidade também) é singular porque nos deixa marcas eternas, nos modifica de forma definitiva, sem chances de retorno ao que éramos antes deles, dos filhos. A experiência da minha irmã transcende a imaginação e nos faz pensar que a vida é dotada de um sentido quase que inescrutável, mas cheio de surpresas que nos levam a supor, por vezes, que a divindade, definitivamente, habita em nós.

Mamãe e o sentido da vida

Li num livro: "Somos criaturas que buscam sentido, que tem que lidar com o inconveniente de serem lançadas num universo que, intrinsecamente, não tem sentido algum".
Palavras perfeitas
Completas
Plenas de sentido.
Dizem tudo sobre meu momento.
Gostei tanto que passaram
A fazer parte de mim.
Tornaram-se um pouco minhas.

Desejo

Queria pegar tudo:
Escrita esmerada
Rasgos de inspiração
Frases elegantes
Leituras enlevadas
Pensamentos desconcertantes
Compondo-os, construindo-os,
Transformando-os todos
Num relicário de palavras...

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

O tamanho das coisas

Aqui e ali...
Vou passando
Vou ficando
Pouco ou o suficiente...
Conheço o sol, o mar, a praia
Conheço a poeira, a secura na garganta
Conheço frio e calor extremos
Mate tomado frio ou tomado quente.
Conheço alegrias e decepções
Coisas e gentes
Que acabam por deixar sua marca
Pela beleza ou pela necessidade
De serem apagadas da mente.
Aqui e ali, tudo vai se conhecendo
Muitos vão se deixando conhecer.
E quando penso nisso tudo
Com frio na barriga
E receio do que ainda há pela frente
Penso que tem que valer a pena
Que o mundo visto por esta lente
É interessante, novo, sempre diferente.
Penso que meu tamanho é o do mundo.

sábado, 20 de fevereiro de 2010

Partilhar

Não queres que eu me divida contigo
Não queres ouvir queixas, ver minhas fraquezas
Queres apenas a imagem de mim
Manter longe a dúvida, ter o conforto da certeza
A idéia de que tudo permanece
E que os abalos são de pequena grandeza.
Resta-me ficar comigo mesma
Tentando desesperadamente aceitar
O que quer que seja.
Restam meus pensamentos recorrentes
Minhas poucas palavras
Minha teimosa franqueza.

sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

Tristeza

A tristeza que perdura
Cá dentro em mim
Procura na razão
Uma explicação
Para a não continuidade
Para a necessidade do fim.

Introspecção

O futuro incerto
O caminho desconhecido
O ponto de interrogação.
Introspecção.

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

Arte

Em mim...a arte!
Por que me tomas?
Onde se enconde?
Em que parte?

Circunstâncias

Forced, under the circumstances, to take some time off...
Why not? Shouldn´t everybody do the same?

Máquina humana

Não me dou com números e códigos
Frios, calculados, exatos
Quase perfeitos.
Admira-me quem o faz...
Mas gosto mesmo das palavras, suas composições
Idéias, sentidos atribuídos
Gestos subentendidos
Desejos expressos e contidos.
Das máquinas... atrai-me a humana
Suas idiossincrasias, singularidades
Seus afetos, seus sentidos
Seus enganos, erros cometidos
Frustrações e imperfeições.
Não me dou com a exatidão.
Prefiro a possibilidade remota
A curva na estrada, a flutuação...

terça-feira, 16 de fevereiro de 2010

Bebidas

Quero beber a vida em taça de cristal
Com algumas frutas frescas
Muitas pedras de gelo
E adoçada com mel
Nos quentes dias de verão dos trópicos...
E quero continuar a bebê-la
Em uma grande caneca com alça lateral
Quente, espessa
Polvilhada de canela
E com um toque de cacau
Quando o inverno quiser gelar
Nosso espírito e nossos sonhos
E quando o cinza do céu se impuser sob o sol...

Passado

Nosso passado sempre nos condenará? Seremos sempre confundidos com nossos atos cometidos em pleno processo de aprendizado de viver? Espero que não... A flecha do tempo corre em uma única direção e o passado deve se converter no arco por meio do qual empunhamos tal flecha. Não temos como mudar o que já foi. É posto. Ao contrário, temos como tentar manter o alvo ao alcance dos olhos...

Feriado

Simples constatação:
Gripe em pleno feriado de Carnaval
Causa embotamento intelectual.

domingo, 14 de fevereiro de 2010

Programação

A vida cumpre com seu cronograma
Nossas expectativas não estão no programa

Incoerências

Estou disponível... em outro lugar
Tenho capacidade... para outra coisa
Posso fazer... não há interesse
Posso mudar... deixe como está
Sei a receita... cadê os ingredientes?
Conheço parte da estrada... perdi o mapa.

Pedras aqui e ali... estão ou são o caminho?

sábado, 13 de fevereiro de 2010

Long night

Tonight
I could remember that time
A place so lifelike
That I still can feel it inside.
After that... a dream.
Strange, grey and empty dream
Long dream... too much long!
People just passing by
Not staying... not talking...
Nothing around...
Long night inside.
I hope tomorrow
The sunrise can finally wake me up
To find again the happiness by my side...

Fernando Pessoa

Pessoa novamente... sempre.

Ameaçou chuva.
E a negra nuvem passou sem mais...
Todo o meu ser se alegra
Em alegrias iguais.
Nuvem que passa...
Céu que fica e nada diz...
Vazio azul sem véu
Sobre a terra feliz...

E a terra é verde, verde...
Por que então minha vista
Por meus sonhos se perde?
De que é que a minha alma dista?

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

Capitu

Naquele momento ela poderia ter sido a inspiração para Machado criar sua Capitu. Sentia, dentro de si, a força do mar batendo, limando os seixos, invadindo a passagem, deixando tudo avesso. Era sua alma agitada extravasando na sua fala, seus gestos, seus olhos. Os olhos... de ressaca.

Fernando Pessoa

Retrato do céu. Metáfora da alma.

Tenho dó das estrelas
luzindo há tanto tempo,
há tanto tempo...
Tenho dó delas.
Não haverá um cansaço das coisas,
de todas as coisas (...)?
Um cansaço de existir,
de ser,
só de ser,
o ser triste brilhar ou sorrir...
Não haverá, enfim,
para as coisas que são,
não a morte,
mas sim uma outra espécie de fim,
ou uma grande razão - qualquer coisa assim
como um perdão?

Vida

Vida... caleidoscópio de possibilidades.
Temos que aprender, atentos
A compor belas imagens
Enxergando-as para além do momento.

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

Infância


Fim de dezembro, muito calor e as crianças todas indo à escola de bermuda e camiseta sem mangas. Neste dia, meu filho de apenas três anos cismou de ir à escola de botas de montaria. Sim, bermuda, camiseta sem mangas e botas de montaria. Quase ridículo! E absolutamente genial, maravilhoso! Quando mais, a não ser na infância, podemos fazer isto? Ou ir ao supermercado vestidos de Super-Homem ou com a máscara do Batman? Ou correr pelo quintal apenas de cueca e com um pedaço de pau na mão imitando uma espada, nos intitulando "Homem- Cueca"? Ou colocar os riggatoni do almoço nos dedos e dizer que eles - os dedos - são feitos de macarrão? Ou falar verdades inconvenientes sem constragimento? Ou sair correndo de medo do bando de passarinhos que, aos berros, sobrevoou o nosso jardim?
Não sei se a vida é uma só, se é apenas esta. Mas sei que a infância passa logo e que, ao nos tornarmos adultos, seremos sempre adultos...

Vasto mundo

O mundo é grande e, desde o início, pouco familiar. Com o tempo, ele vai nos mostrando todas as coisas - seus lugares, seus encantos e sua escuridão... Nos mostra também aqueles que nele vivem - as pessoas, o mais importante. Torná-lo familiar é um processo lento, difícil, doloroso por vezes... O processo da vida. É o que nos move e o que nos transforma. Quanto mais vivemos e mais conhecemos, mais partilhamos dessa aventura de sermos apresentados a tudo o que nos rodeia...
Quero sentir o mundo dentro de mim, quero tê-lo como algo cada vez mais conhecido e, ao mesmo tempo, sempre novo... Quero não ter medo de ir em frente e ver o que ainda não vi, nem sei, nem ter vontade de voltar sempre ao lugar primeiro - o ninho, inicial, familiar, sempre encantado. Quero ganhar asas, voar, me sentir mais leve, poder ver tudo o que está em volta com olhos de supremo interesse e de desejo curioso. Quero ter comigo, sobretudo, as pessoas, sempre... aquelas que passam e que encantam, de algum modo, com sua fala, seus olhos, sua doçura, sua sabedoria ou apenas com seu bom humor...
Como Fernando Pessoa, quero sentir-me nascida a cada dia para a eterna novidade do mundo, tendo o medo apenas como um tempero, um "frio na barriga", nunca um impedimento.

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

Chuvas de verão

Na minha mente... uma enxurrada de idéias...
E assim como as chuvas, elas mesmas,
As palavras que delas brotam - das enxurradas -
Ajudam, por vezes,
A apaziguar a estiagem...
Outras vezes, entretanto são não mais
Que águas que transbordam e rompem diques
Que quase afogam
Que tiram o fôlego, o foco e a tranquilidade
Que deve habitar na alma...
Prefiro tempos amenos... mesmo silenciosos...

Insônia

E então a súbita insônia escorre pelo papel, transformando-se em palavras entrelaçadas... Frases. Um pequeno texto.
Silêncio. Voltar a dormir.

Exercício

Pare. Respire (lembrou de fazer isto hoje?). Novamente, então.
Apague a luz das idéias. Descarrile o trem dos pensamentos. Faça calar, uma a uma, as palavras.
Aprecie. Espere. Escute.
O teclado. O grito de araras. Um bem te vi. Carros.
O mundo volta ao seu eixo.

O novo

E a menina corre esperançosa em direção ao ventre daquele Lugar procurando uma sensação de familiaridade e gratidão há algum tempo perdidas...
Aqueles braços estarão abertos?

Como é

As coisas, por serem como são
Devem ficar como estão
Para que possam, de algum modo
Vir a ser...

terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

Para todos os dias...

"...try a little tenderness..."

Solidão

Quanto ao estar só... sei o quanto é necessário no nosso processo de imersão em nós mesmos, no nosso auto-conhecimento... mas sinto falta da família e dos amigos, partilhando o café da tarde e o bolo de fubá feitos carinhosamente antes do jantar...

Procura-se

Procura-se: alguém que me ensine
a não pagar pelo excesso de bagagem,
a andar sem me preocupar com o destino,
a apreciar a viagem...

domingo, 7 de fevereiro de 2010

Tudo novo

Ah... desacelera coração... que a vida é cheia de paradas nas mais diferentes paisagens...