sexta-feira, 27 de agosto de 2010

Re-sentimento

Pegue sua raiva. Ponha-a em um recipiente. Guarde-a. Deixe-a destilando por algum tempo. Não, não despeje-a imediatamente, substância turva, azeda, vômito incontido. Deixe-a quieta. Olhe de longe para ela, analise-a, resguardando-se - o tanto quanto isto for possível! Separe os elementos mais sólidos dos fluidos. Quando percebê-los com nitidez, escolha os mais interessantes. Ou os mais repugnantes. Ou os esquisitos. Os mais desagradáveis. Ou os viscosos. Dê, aos eleitos, outro destino. Um lugar simbólico, de significação própria. Transforme-os. Componha um texto, crie uma imagem. Faça nascer um conto, uma história, uma poesia. Não se desfaça do sentimento. Faça com que ele seja impiedosamente seu e, sobretudo, sedativamente belo. Transforme a raiva em ouro. Permita nascer o verbo.

3 comentários:

Anônimo disse...

Voce está sendo discipula de Niestch.
Ele analisando o teatro grego propôs que os atores transformavam o feio (dramas) em belo e assim odiam olhar para o feio e até mesmo torná-lo arte. O feio pode ser bonito se for feito o que vc propõe.Aliás pode até ser aplaudido num teatro ou emocionar pessoas numa leitura.
Beijos do
Papi

Anônimo disse...

Muito profundo e admirável o destino do seu sentimento. Ele fez-me lembrar de um conhecido dito popular:"A vingança é um prato que se come frio". Mas realmente o mais interessante é, ao olhar "aquele prato", talvez melhor seja mesmo perceber tudo que há lá - separar, analisar, refletir e... jogar no lixo. E então partir para sabores que nos deliciem.

Mamy

Anônimo disse...

Onde escrevi odiam leia-se podiam.
Que lapso interessante!

Papi